Carta de Amor
Não é fácil anunciar a mudança que fizeste.
Se estou viva agora, antes estava morta,
Embora, como uma pedra, isso não me incomodasse,
Ficar parada de acordo com o hábito.
Não me tocaste um centímetro, não -
Nem me deixaste fixar o meu pequeno olho calvo
De novo em direcção ao céu, sem esperança, é claro,
De cativar o azul, ou as estrelas.
Não foi isso. Dormi, digo: uma serpente
Camuflada entre rochas negras como uma rocha negra
No hiato branco do inverno -
Como os meus vizinhos, sem prazer
No milhão perfeitamente cinzelado de
Faces descendo a cada momento para derreter
A minha face de basalto. Começaram a chorar,
Anjos choravam por naturezas monótonas,
Mas não me convenceram. Essas lágrimas congelaram.
Cada cabeça morta tinha uma viseira de gelo.
E dormi como um dedo dobrado.
A primeira coisa que vi foi o ar puro
E as gotas presas crescendo num orvalho
Límpido como espíritos. Muitas pedras jazem
Densas e inexpressivas em redor.
Não sabia o que fazer com isso.
Dei lustro, escalei a mica e desabrochei
Para me derramar como um fluido
Entre pés de pássaros e caules de plantas.
Não fui enganada. De imediato te conheci.
Árvore e pedra brilhavam, sem sombras.
O comprimento do meu dedo ficou lúcido como um espelho.
Comecei a brotar como um galho de Março:
Um braço e uma perna, um braço, uma perna.
De pedra em nuvem, depois ascendi.
Agora pareço uma espécie de deus
A flutuar pelo ar na metamorfose da minha alma
Pura como um painel de gelo. É uma dádiva.
The Collected Poems | Sylvia Plath
© 1981 The Estate of Sylvia Plath
Editorial material © 1981 Ted Hughes
Versão Portuguesa © Luísa Vinuesa