Viúva

Viúva. A palavra consome-se a si mesma -
Corpo, uma folha de jornal no fogo
Levitando um minuto entorpecido na corrente de ar
Sobre a escaldante topografia vermelha
que projecta o seu coração como um único olho. 

Viúva. A sílaba morta, com a sua sombra
De um eco, expõe o painel na parede
Atrás da qual está a passagem secreta - o ar viciado,
Memórias empoeiradas, a escada em espiral
que abre no cimo para o nada ... 

Viúva. A aranha amarga senta-se
E senta-se no centro da teia sem amor.
A morte é o vestido que usa, o seu chapéu e a gola.
O rosto de mariposa do seu marido, branco como a lua e doente,
Rodeia-a como uma presa que adoraria matar
 
Uma segunda vez, para tê-lo perto de novo -
Uma imagem de papel para colocar contra o  coração
A maneira como afagava as suas cartas, até que esquentassem
E parecessem dar-lhe calor, como uma pele viva.
Mas é ela que é papel agora, não aquecida por ninguém. 

Viúva: que grande propriedade vaga!
A voz de Deus está cheia de correntes de ar,
Prometendo simplesmente as duras estrelas, o espaço
Do vazio imortal entre estrelas
E nenhum corpo, cantando como flechas para o céu. 

Viúva, as árvores compassivas curvam-se,
As árvores da solidão, as árvores do luto.
Permanecem como sombras sobre a paisagem verde -
Ou mesmo como buracos negros dele recortados.
Uma viúva assemelha-se a eles, uma coisa-sombra, 

A mão dobrando a mão, e nada no meio.
Uma alma sem corpo poderia passar através de outra alma
Neste ar limpo e nunca perceber -
Uma alma passa através de outra, frágil como fumaça
E ignorando totalmente a passagem que tomou. 

Esse é o medo que tem - o medo
A sua alma pode vencer e vence em seu enfadonho sentido
Como o anjo azul de Maria, como um pombo contra uma vidraça
Cego para tudo, excepto para a sala cinzenta e sem ânimo
Que olha e deve continuar a olhar.




The Collected Poems | Sylvia Plath
© 1981 The Estate of Sylvia Plath 
Editorial material © 1981 Ted Hughes
Versão Portuguesa © Luísa Vinuesa 

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